Monday, July 30, 2007
CORPUS
textos
A SAGA DOS HOMENS-CUPIM
Ao observar os tratores que rasgavam a Transamazônica na década de 70, os índios inventaram um apelido mais que adequado para aqueles cidadãos sombrios,
de motosserra em punho, que abriam longas feridas na floresta. Chamaram-nos de homens-cupim. Nos [ultimos 100 anos, os cupins humanos devoraram florestas
com eficiência de assustar seus parentes invertebrados.
A marcha dos madeireiros começou no Sul do Brasil, alimentando-se das araucárias do Paraná e de Santa Catarina. Depois, atacou as reservas de jacarandá
do Espírito Santo e da Bahia e, na década de 70, chegou ao Norte para roer o mogno. Agora eles avançam sobre a última terra prometida, o Amazonas, aonde o
governo tenta atrair madereiros paraenses com promessa de isenção fiscal, vastas concessões de terrenos e até sociedade com o Estado em empresas exportadoras
de madeira.
Veja, 94. 8 nov.1994
JOÃO e MARIA
Chico Buarque de Holanda
Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você, além das outras três
Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava um rock para as matinês
Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz
E você era a princesa que eu quiz coroar
E era tão linda de se admirar
E andava nua pelo meu país
Não, não fuja não
Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião
O seu bicho preferido
Vem, me dê a mão
A gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade
Acho que a gente nem tinha nascido
Agora era fatal
Que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim.
Sivuca et Chico Buarque de Holanda. São Paulo, Abril Educação, 1980. (Literatura Comentada)
APELO
Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa da esqui-
na. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia da sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo
da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora
da noite eles se iam e eu ficava só, sem o perdão de sua presença a todas as aflições do dia, com a última luz na varanda.
E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero da salada - meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas,
na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem
a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.
Dalton Trevisan. Apelo. In:BOSI, Alfredo.ORG. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo, Cultrix/Edusp.1975. p.190
CONTO POPULAR
Era uma vez um escorpião que estava na beira de um rio, quando a vegetação da margem começou a queimar. Ele ficou desesperado, pois, se pulasse na água,
morreria afogado e, se permanecesse onde estava, morreria queimado. Nisso, viu um sapo que estava preparando-se para saltar no rio e, assim, livrar-se do
fogo. Pediu-lhe, então, que o transportasse nas costas para o outro lado. O sapo respondeu-lhe que não faria de jeito nenhum o que ele estava solicitando, porque
ele poderia dar-lhe uma ferroada, levando-o à morte por envenenamento. O escorpião retrucou que o sapo precisaria guiar-se pela lógica; ele não poderia dar-lhe
uma ferroada, pois, se o sapo morresse, ele também morreria, porque se afogaria. O sapo disse que o escorpião estava certo e concordou em levá-lo até a outra
margem. No meio do rio, o escorpião pica o sapo.l Este, sentindo a ação do veneno, vira-se para aquele e diz que só gostaria de entender os motivos que fizeram
que fizeram que ele o picasse, já que o ato era prejudicial também ao escorpião. Este, então, responde qaue simplesmente não podia negar a sua natureza.
- cada ser humano tem uma índole, uma propensão natural, e ela não mjuda, manifesta-se em todas as circunstâncias da vida, até mesmo quando essa manifestação
contraria o bom senso.
(Lições de texto: leitura e redação. Platão e Fiorin. 4.ed.São Paulo - Ática.
O CURURU
Tudo quieto, o primeiro cururu surgiu na margem, molhado, reluzente na semi-escuridão. Engoliu um mosquito: baixou a cabeçorra: tragou um cascudinho; mergulhou
de novo, e bum-bum! Soou uma nota soturna do concerto interrompido. Em poucos instantes, o barreiro ficou sonoro, como um convento de frades. Vozes roucas, foi-
não-foi, tãs=tãs, bum-bum, choros, esgoelamentos finos de rãs, acompanhamentos profunhdos de sapos, respondiam-se.
Os bichos aparecaim, mergulhavam, arrrastavam-se nas margens, abriam grandes círculos na flor d'água. (...)Daí a pouco, da bruta escuridão, surgiram dois
vagalumes. Um sapo cururu grelou-os e ficou deslumbrado, com os olhos esbugalhados, presos naquela boniteza luminosa. Os dois olhos fosforescentes se
aproximavam mais e mais, como dois pequenos hologotes na cabe;a triangular da serpente. O sapo não se movia, fasciando. Sem dúvida queria fugir; previa
o perigo, porque emudecera; mas ja não podia andar, imobilizado; os p;jps feiíssimos, agarrados aos olhos luminosos e bonitos como um pecado. Num bote
a cabeça triangular abocanhou a boca imiunda do batráquio. Ele não podia fugir àquele beijo. A boca fina do réptil arreganhou-se desmesuradamente;
envolveu o sapo até os olhos. Ele se baixava dócil entgregando-se à morte tentadora, apenas agitando docemente as patas sem provocar nenhuma reação
ao sacrifício. A barriga disforme e negra desaparecdeu na goela dilatada da cobra. E, num minuto, as perninhas do cururu lá se foram, ainda vivas,
para as entranhas famélicas. O coro imenso continuava sem dar fé do que aocntecia a um dos seus cantores.
(Jorge de Lima. Calunga : O anjo. 3.ed. Rio de Janeior, Agir. 1959. p.160-1)
O LOBO e o CORDEIRO
(fábula de La Fontaine)
Vamos mostrar que a razão do mais forte é sempre a melhor.
Um cordeiro matava a sede numa corrente de água pura, quanda chega um lobo cuja fome o levava a buscar caça.
- Que atrevimento é esse de sujar a água que estou bebendo? - diz enfurecido o loho. - Você será castigado por essa remeridade.
- Senhor - responde o cordeiro -, que Vossa Majestade não se encolerize e leve em conta que estou bebendo vinte passos mais abaixo que o Senhor.
Não posso, pois, sugar a água que está bebendo.
- Você a suja - diz o cruel animal. - Sei que você falou mal de mim no ano passado.
- Como eu poderia t^-lo feito, se não havia sequer nascido? - responde o cordeiro. - Eu ainda mamo.
- Se não foi você, foi seu irmão.
- Eu não tenho irmãos.
- Entào, foi alguém dos seus, porque todos vocês, inclusive pastores e cães, não me poupam. Disseram-me isso e, portanto, preciso vingar-me.
Sem fazer nenhuma outra forma de julgamento, o lobo pegou o cordeiro, estraçalhou-o e devorou-o.
La Fontaine .....(ver) p. 125. Platao e Fiorin. Lições de Texto)
A mãe do século ou, pelo barulho, do milênio
(Ruy Castro (Especial))
Nem Cristo foi tão esperado. Nem o bebê de Rosemary. Nem Louise, o primeiro bebê de proveta. Nem Dolly, a famosa ovelha-clone. Até mesmo Madonna
e Michael Jackson, que também foram mães há pouco tempo, conseguiram ser mais discretos. Com todo esse barulho, por ter mais o que dizer, perdi os imor-
tais dez minutos do Jornal Nacional de terça-feira, que registraram o primeiro banho, o primeiro choro, o primeiro bocejo e o primeiro espirro de Sasha,
a filha da Xuxa com um portador de sêmem. Mas não há de ser nada. A continuar nessa batida, ainda hei de ver o primeiro regurgito, o primeiro dedo na
tomada, o primeiro tombo no velocípede e a primeira má-criação de Sasha.
Sim, porque, de uma maneira ou de outra, tudo será exibido para os milhões de brasileiros que terão de continuar vivendo em função da filha de Xuxa.
(...)No mínimo, pela pressa com que telfonaram para Xuxa na maternidade, o presidente Ménem decretará feriado na Argentina e Ronaldinho terá mais
uma convulsão.
(...) Imagine se Xuxa resolver criá-la à base dos produtos que vive recomendando pela televisão às crianças brasileiras. Esgotado o leite materno,
teremos Sasha sendo alimentada com achocolatado Mágico da Arisco, goiabada da Arisco, maionese da Arisco, ketgchup da
Arisco, mostarda da Arisco e massa de tomate da Arisco. Não é uma previsão exagerada já que, neste exato momento, Sasha já deve estar usando a chupeta
da Xuxa, a mamadeira da Xuxa, o xampu da Xuxa, a melissinha de tricô da Xuxa e a maquiagem infantil da Xuxa, abrindo apenas uma exceção para a fralda
da Sasha, cujo comercial também já está no ar.
(Publicado no jornal O Estado de São Paulo, Caderno 2, de 1/8/1998. p. D20)
VALSINHA
Um dia ele chegou tão diferente
Do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente
Do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto
Quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto
Pra seu grande espanto
Convidou-a pra rodar
Então ela se fez bonita
Como há muito tempo
Não queria ousar
O seu vestido decotado
Cheirando a guardado
De tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços
Como há muito tempo
Não se usava dar
E cheios de ternura e graça
Foram para a praça
E começaram a se abraçar
E aí dançaram tanta dança
Que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
Que toda cidade
Se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos
Como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu em paz.
BUARQUE,Chico.In: BOLLE,Adélia, B. M.,org. Chico Buarque de Holanda.São Paulo: Abril Educação,1980. p.30-1.
GERIN,Júlia. Português - Educação de Jovens e Adultos - Ensino fundamental 5a. a 8a. séries - volume único. Curitiba: Educarte, 1997 p.245
textos
A SAGA DOS HOMENS-CUPIM
Ao observar os tratores que rasgavam a Transamazônica na década de 70, os índios inventaram um apelido mais que adequado para aqueles cidadãos sombrios,
de motosserra em punho, que abriam longas feridas na floresta. Chamaram-nos de homens-cupim. Nos [ultimos 100 anos, os cupins humanos devoraram florestas
com eficiência de assustar seus parentes invertebrados.
A marcha dos madeireiros começou no Sul do Brasil, alimentando-se das araucárias do Paraná e de Santa Catarina. Depois, atacou as reservas de jacarandá
do Espírito Santo e da Bahia e, na década de 70, chegou ao Norte para roer o mogno. Agora eles avançam sobre a última terra prometida, o Amazonas, aonde o
governo tenta atrair madereiros paraenses com promessa de isenção fiscal, vastas concessões de terrenos e até sociedade com o Estado em empresas exportadoras
de madeira.
Veja, 94. 8 nov.1994
JOÃO e MARIA
Chico Buarque de Holanda
Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você, além das outras três
Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava um rock para as matinês
Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz
E você era a princesa que eu quiz coroar
E era tão linda de se admirar
E andava nua pelo meu país
Não, não fuja não
Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião
O seu bicho preferido
Vem, me dê a mão
A gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade
Acho que a gente nem tinha nascido
Agora era fatal
Que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim.
Sivuca et Chico Buarque de Holanda. São Paulo, Abril Educação, 1980. (Literatura Comentada)
APELO
Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa da esqui-
na. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia da sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo
da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora
da noite eles se iam e eu ficava só, sem o perdão de sua presença a todas as aflições do dia, com a última luz na varanda.
E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero da salada - meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas,
na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem
a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.
Dalton Trevisan. Apelo. In:BOSI, Alfredo.ORG. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo, Cultrix/Edusp.1975. p.190
CONTO POPULAR
Era uma vez um escorpião que estava na beira de um rio, quando a vegetação da margem começou a queimar. Ele ficou desesperado, pois, se pulasse na água,
morreria afogado e, se permanecesse onde estava, morreria queimado. Nisso, viu um sapo que estava preparando-se para saltar no rio e, assim, livrar-se do
fogo. Pediu-lhe, então, que o transportasse nas costas para o outro lado. O sapo respondeu-lhe que não faria de jeito nenhum o que ele estava solicitando, porque
ele poderia dar-lhe uma ferroada, levando-o à morte por envenenamento. O escorpião retrucou que o sapo precisaria guiar-se pela lógica; ele não poderia dar-lhe
uma ferroada, pois, se o sapo morresse, ele também morreria, porque se afogaria. O sapo disse que o escorpião estava certo e concordou em levá-lo até a outra
margem. No meio do rio, o escorpião pica o sapo.l Este, sentindo a ação do veneno, vira-se para aquele e diz que só gostaria de entender os motivos que fizeram
que fizeram que ele o picasse, já que o ato era prejudicial também ao escorpião. Este, então, responde qaue simplesmente não podia negar a sua natureza.
- cada ser humano tem uma índole, uma propensão natural, e ela não mjuda, manifesta-se em todas as circunstâncias da vida, até mesmo quando essa manifestação
contraria o bom senso.
(Lições de texto: leitura e redação. Platão e Fiorin. 4.ed.São Paulo - Ática.
O CURURU
Tudo quieto, o primeiro cururu surgiu na margem, molhado, reluzente na semi-escuridão. Engoliu um mosquito: baixou a cabeçorra: tragou um cascudinho; mergulhou
de novo, e bum-bum! Soou uma nota soturna do concerto interrompido. Em poucos instantes, o barreiro ficou sonoro, como um convento de frades. Vozes roucas, foi-
não-foi, tãs=tãs, bum-bum, choros, esgoelamentos finos de rãs, acompanhamentos profunhdos de sapos, respondiam-se.
Os bichos aparecaim, mergulhavam, arrrastavam-se nas margens, abriam grandes círculos na flor d'água. (...)Daí a pouco, da bruta escuridão, surgiram dois
vagalumes. Um sapo cururu grelou-os e ficou deslumbrado, com os olhos esbugalhados, presos naquela boniteza luminosa. Os dois olhos fosforescentes se
aproximavam mais e mais, como dois pequenos hologotes na cabe;a triangular da serpente. O sapo não se movia, fasciando. Sem dúvida queria fugir; previa
o perigo, porque emudecera; mas ja não podia andar, imobilizado; os p;jps feiíssimos, agarrados aos olhos luminosos e bonitos como um pecado. Num bote
a cabeça triangular abocanhou a boca imiunda do batráquio. Ele não podia fugir àquele beijo. A boca fina do réptil arreganhou-se desmesuradamente;
envolveu o sapo até os olhos. Ele se baixava dócil entgregando-se à morte tentadora, apenas agitando docemente as patas sem provocar nenhuma reação
ao sacrifício. A barriga disforme e negra desaparecdeu na goela dilatada da cobra. E, num minuto, as perninhas do cururu lá se foram, ainda vivas,
para as entranhas famélicas. O coro imenso continuava sem dar fé do que aocntecia a um dos seus cantores.
(Jorge de Lima. Calunga : O anjo. 3.ed. Rio de Janeior, Agir. 1959. p.160-1)
O LOBO e o CORDEIRO
(fábula de La Fontaine)
Vamos mostrar que a razão do mais forte é sempre a melhor.
Um cordeiro matava a sede numa corrente de água pura, quanda chega um lobo cuja fome o levava a buscar caça.
- Que atrevimento é esse de sujar a água que estou bebendo? - diz enfurecido o loho. - Você será castigado por essa remeridade.
- Senhor - responde o cordeiro -, que Vossa Majestade não se encolerize e leve em conta que estou bebendo vinte passos mais abaixo que o Senhor.
Não posso, pois, sugar a água que está bebendo.
- Você a suja - diz o cruel animal. - Sei que você falou mal de mim no ano passado.
- Como eu poderia t^-lo feito, se não havia sequer nascido? - responde o cordeiro. - Eu ainda mamo.
- Se não foi você, foi seu irmão.
- Eu não tenho irmãos.
- Entào, foi alguém dos seus, porque todos vocês, inclusive pastores e cães, não me poupam. Disseram-me isso e, portanto, preciso vingar-me.
Sem fazer nenhuma outra forma de julgamento, o lobo pegou o cordeiro, estraçalhou-o e devorou-o.
La Fontaine .....(ver) p. 125. Platao e Fiorin. Lições de Texto)
A mãe do século ou, pelo barulho, do milênio
(Ruy Castro (Especial))
Nem Cristo foi tão esperado. Nem o bebê de Rosemary. Nem Louise, o primeiro bebê de proveta. Nem Dolly, a famosa ovelha-clone. Até mesmo Madonna
e Michael Jackson, que também foram mães há pouco tempo, conseguiram ser mais discretos. Com todo esse barulho, por ter mais o que dizer, perdi os imor-
tais dez minutos do Jornal Nacional de terça-feira, que registraram o primeiro banho, o primeiro choro, o primeiro bocejo e o primeiro espirro de Sasha,
a filha da Xuxa com um portador de sêmem. Mas não há de ser nada. A continuar nessa batida, ainda hei de ver o primeiro regurgito, o primeiro dedo na
tomada, o primeiro tombo no velocípede e a primeira má-criação de Sasha.
Sim, porque, de uma maneira ou de outra, tudo será exibido para os milhões de brasileiros que terão de continuar vivendo em função da filha de Xuxa.
(...)No mínimo, pela pressa com que telfonaram para Xuxa na maternidade, o presidente Ménem decretará feriado na Argentina e Ronaldinho terá mais
uma convulsão.
(...) Imagine se Xuxa resolver criá-la à base dos produtos que vive recomendando pela televisão às crianças brasileiras. Esgotado o leite materno,
teremos Sasha sendo alimentada com achocolatado Mágico da Arisco, goiabada da Arisco, maionese da Arisco, ketgchup da
Arisco, mostarda da Arisco e massa de tomate da Arisco. Não é uma previsão exagerada já que, neste exato momento, Sasha já deve estar usando a chupeta
da Xuxa, a mamadeira da Xuxa, o xampu da Xuxa, a melissinha de tricô da Xuxa e a maquiagem infantil da Xuxa, abrindo apenas uma exceção para a fralda
da Sasha, cujo comercial também já está no ar.
(Publicado no jornal O Estado de São Paulo, Caderno 2, de 1/8/1998. p. D20)
VALSINHA
Um dia ele chegou tão diferente
Do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente
Do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto
Quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto
Pra seu grande espanto
Convidou-a pra rodar
Então ela se fez bonita
Como há muito tempo
Não queria ousar
O seu vestido decotado
Cheirando a guardado
De tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços
Como há muito tempo
Não se usava dar
E cheios de ternura e graça
Foram para a praça
E começaram a se abraçar
E aí dançaram tanta dança
Que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
Que toda cidade
Se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos
Como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu em paz.
BUARQUE,Chico.In: BOLLE,Adélia, B. M.,org. Chico Buarque de Holanda.São Paulo: Abril Educação,1980. p.30-1.
GERIN,Júlia. Português - Educação de Jovens e Adultos - Ensino fundamental 5a. a 8a. séries - volume único. Curitiba: Educarte, 1997 p.245
Friday, May 25, 2007
Tema para monografia:
Utilização da teoria de Tesnière e da Gramática de Valências na interpretação e construção do sentido do texto.
1. Justificativa
2. Objetivo
Objetiva-se com este trabalho descobrir um caminho mais lógico para o exercício da construção dos sentidos e interpretação dos textos para alunos do ensino fundamental, de forma que ao mesmo tempo ele esteja familiarizado com os conceitos sintáticos e semânticos, os quais não se pretende separar.
Tendo como objetivo descrever como o falante distribui as informações na frase para obter a atenção do seu ouvinte na interação verbal, ou seja, o desempenho lingüístico do falante, a gramática funcional pretende chegar à estrutura da frase. O falante pode fazer alterações na ordem dessas informações para contribuir para a comunicação com o intuito de controlar a atenção do ouvinte. Em outras palavras, esse fluxo de informações está relacionado com a organização linear dos sintagmas nominais na frase. Estou falando do que na gramática funcional denomina-se ‘tópico e comentário’, ‘sujeito e predicado’, ‘informação dada e informação nova’, ‘tema’ e ‘rema’, etc. (Neves, 2001, p.32-34).
A função ideacional é um componente do significado no sistema lingüístico. Em outras palavras, a linguagem serve à expressão do onteúdo, isto é, tem uma função ideacional, ou seja, significado cognitivo. É por meio dessa função que o falante e o ouvinte organizam e incorporam, ou seja, codificam na língua, sua 7 Uma rede sistêmica constitui um conjunto finito de traços.
[…] ‘função’ pode ser pensada como um sinônimo para a palavra ‘uso’, logo, quando falamos sobre funções da linguagem, podemos apenas significar a forma como as pessoas usam sua língua ou suas línguas se tiverem mais de uma. experiência dos fenômenos do mundo, o que inclui o mundo interno da própria consciência, suas reações, cognições, percepções, assim como seus atos lingüísticos
de falar e entender. A função ideacional é a função dos significados. Essa função liga- se ao sistema de transitividade e está associada na frase aos papéis de ator, meta, etc.
Trata-se da frase como processo (Neves, 2001, p.60-61).
3. Metodologia
Pretende-se para realização do trabalho a desenvolver, bem como a razão da divisão do texto em capítulos, seções e subseções, a seguir apresentar-se-á comentários sobre a metodologia utilizada, que segue rigorosamente os padrões estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).
A metodologia usada para a realização da pesquisa partiu da escolha do tema, baseado num enfoque considerado pelo pesquisador como necessário para nossos dias. Escolhido o tema, depois o orientador na área, passou-se a procurar as obras para leitura, numa ordem sugerida pelo professor-orientador. Essas obras, conforme descrição na bibliografia, fornecerão embasamento teórico necessário para argumento e comprovação do tema. Também está-se em busca de verificação se nossas gramáticas abordam tais assuntos e, à medida da evolução da pesquisa, pretende-se aplicar resultados para observar o sucesso do tema aplicado.
Bibliografia
SACCONI, L. A.Gramática Essencial Ilustrada – GEI. São Paulo: Atual, 1994.
IGNÁCIO,S.E.Análise sintática em três dimensões:uma proposta pedagógica.Franca,São Paulo:Ribeirão Gráfica e Editora,2003.
CARONE,F.B.Morfossintaxe.3.ed.,São Paulo:Ática,1986.[série Princípios]
BORBA,F.S.et alii.Dicionário gramatical de verbos do português contemporâneo do Brasil.São Paulo:Editora UNESP,1990.
CHAFE, Estrutura e significados para verbos.
TESNIÉRE. Sintaxe Estrutural
BORBA, . Gramática de Valências.
VILLELA, ..........
MARIA HELENA e ILARI...........
ILARI, Rodolfo. Introdução à Semântica – brincando com a gramática. 5 ed. São Paulo: Contexto, 2004.
(embasamento teórico )
(obras consultadas)
A teoria de Tesnière se fundamenta na centralidade do verbo. Além de Tesnière, segue-no Fillmore(1971), Chafe(1979), Ignácio(1984), entre outros. De acordo com a proposta da centralidade do verbo, é ele, e não o sujeito o centro estruturador da oração. Nessa visão, a oração se estrutura a partir da valência verbal, isto é, existem elementos que se relacionam com o verbo, estabelecendo com ele relações sintático-semânticas para compor a oração. Para Tesnière, a palavra que se prende à outra, forma com ela um ‘nó’, e como todas palavras se prendem ao verbo, ele diz, que o verbo é o nó central.
Fillmore, também é seguidor da centralidade do verbo, porém, estudou as relações entre os constituintes de uma sentença. Tratando da semântica lexical, ele desenvolveu um modelo alternativo de gramática, estabelecendo que a sentença era constituída de um verbo e de um ou mais SNs, onde cada um estabelecia uma relação particular com o verbo.
Para Fillmore, se houver dois SNs na sentença, o de maior hierarquia, este será o sujeito. Estabeleceu então, um grupo de palavras, que dependendo do sentido, essas palavras podem tomar diferentes posições na frase , sempre ligadas ao verbo e entre si. Esse estudo chama-se Gramática de Casos, de Fillmore, que trata dos papéis semânticos ou temáticos, ou sejam: agentes, pacientes, receptivos e outros, que trataremos mais adiante.
Concordando também com centralidade do verbo é a Tipologia Verbal de Chafe, que vai analisar a visão dos verbos, sobre o ponto de vista lógico-semântico: verbos de estado, de ação, de processo, de ação-processo, que também veremos adiante com maiores detalhes.
Lucien Tesnière
A partir de Tesnière (1953/1959), a divisão a oração em Sujeito e Predicado tem sido contestada. Com ele surge o princípio da centralidade do verbo na organização da oração e, a oração é comparada a um pequeno drama, onde o enredo é o verbo. Envolvidos nesse drama estão três personagens e a ação desenrola-se entre as mais variadas circunstâncias, assim como ocorre na vida real. Por isso ele chama de atores esses três personagens, são gramaticalmente chamados de actantes. Ao lado desses actantes, surgem os circunstantes, para a gramática tradicional, os adjuntos adverbiais. Esses actantes se articulam com o verbo e vai determinar a valência desse verbo.
Assim, o verbo passa a ser o elemento a partir do qual a oração se organiza e o sujeito, passa a ter a configuração de um complemento no mesmo nível sintático do Objeto, considerando, obviamente a sua distinção pelo seu papel semântico.
Como vimos, na teoria dos “nós”, elementos da oração se prendem ao verbo, formando com ele numa relação de dependência. Valência é o nome dado a esse tipo de dependência de outras palavras da oração com o verbo. Foi Tesnière que difundiu de maneira mais bem sistematizada, o conceito de valência verbal. Portanto, o verbo é classificado pela sua valência, isto é, pelo número de elementos que vão preencher as “casas vazias” da estrutura oracional, às quais o verbo está comandando. Esses lugares vazios, ou casas vazias, são preenchidas por elementos, que Tesnière os chamou de actantes.
Uma gramática de valência procura detectar relações de dependência entre categorias (básicas) que (co) ocorrem num contexto. (...)uma gramática de valências toma como nuclear um elemento oracional (o verbo) e demonstra como os demais se dispõem em torno dele através de relações de dependência. (Borba,1996:16-17).
A Gramática de Valências estuda os valores semânticos, a natureza morfossintática e o número dos elementos nominais obrigatórios ( Argumentos) exigidos pelo verbo ou pelo nome.
De acordo com sua valência, os verbos recebem nomes especiais:
avalentes – quando não tiver necessidade de nenhum actante. Acontecem com os verbos impessoais:
- São dez horas(sem consulta)
monovalentes – quando tiver necessidade de apenas um actante. Acontecem com os verbos de ação, como andar, voar, correr, e de processo como adoecer, crescer, engordar, etc:
Bivalentes – quando tiver necessidade de dois actantes:
Trivalentes – quando tiver necessidade dos três actantes:
Esses actantes são representados por palavras substantivadas e os circunstantes, adverbiais.
Translação e Estema
Tesnière apresenta duas maneiras para explicar a sintaxe da oração: a translação e o estema.
A translação tenta explicar a conexão entre as palavras, Tesnière criou um critério de verificação onde evidencia as possibilidades de relações entre as classes, pela vizinhança vertical e horizontal. Ele criou um quadro dividido em quatro partes, representando cada parte, uma classe gramatical. Situou na parte superior substantivo e verbo e nas inferiores, adjetivo e advérbio. Adotou uma letra do alfabeto para simbolizar cada categoria: o substantivo, O; o verbo, I; o adjetivo, A e o advérbio, E. Cada uma dessas palavras podem assumir o comportamento das outras três. Essa mudança de comportamento se faz através do recurso de uma preposição, dizemos então que há um SP.
Para Tesnière, a translação é a mudança de comportamento gramatical de uma palavra. A translação é necessária porque muitas vezes em português não conseguimos expressar a idéia de um adjetivo com uma única palavra. Daí a necessidade de usarmos um SP. Nesse caso, muitas vezes há a mudança da classe gramatical da palavra – isso corresponde a translação. No entanto, nem toda preposição acarreta um caso de translação.
Por exemplo: panela de arroz. A expressão não se refere a uma panela que contenha arroz, e sim, uma panela de se cozinhar o arroz. Necessitou-se de uma preposição para exprimir o desejo de se referir aquele objeto. Neste caso, através da preposição efetuou-se uma translação, ou seja, uma termo que era substantivo arroz, passou a ser adjetivo, porque deu uma qualidade para a panela.
Para esquematizar o processo, então chamado de translação, Tesnière desenhou um esquema gráfico da seguinte maneira:
Esquematizando, podemos fazer a representação pela letra “T” maiúscula, inicial da palavra translação. À esquerda coloca-se o instrumento de translação, geralmente, uma preposição, chamada de translativo. À direita do T, coloca-se o elemento que sofre a translação, no caso, o transferendo e, acima da barra do “T”, coloca-se o transferido, assinalado pelo seu símbolo, ou seja, o resultado da translação.
Pode ocorrer que não haja o translativo e que a translação ocorra simplesmente entre dois substantivos, um deles, com caráter adjetivo: Exemplo: O viaduto Sarney. Nesse caso, um substantivo comporta-se como epíteto do outro ( adjunto adnominal).
Também é preciso considerar que o verbo “ser” por si só provoca uma translação. Todo verbo ser caracteriza um predicado nominal, por isso chamado predicativo. Se o núcleo é um predicativo, obviamente, o predicado toma a característica verbal.
b) Estema
É a outra possibilidade de mostrar a sintaxe por Tesnière. Nesse sentido, para recuperar a ordem da frase, tem-se que localizar primeiro os verbos, depois os actantes, depois os circunstantes. Localizado o verbo, procura-se a sua valência.
Estema (Tesnière trabalha com “nós”)
Portanto, estema é o nome que Tesnière dá à a representação gráfica das relações sintáticas das palavras na oração: No alto o verbo, no segundo nível e à esquerda, os valores substantivos e à direita, os valores adverbiais, os circunstantes. Conexões sintáticas são representadas por linhas retas perpendiculares. Segue abaixo dois exemplos de estemas completos. 1º ex: “A CSN zerou com o BNDES suas dívidas, em agosto.”
(VEJA,2005.p.35)
O estema, por ter uma conotação semântica, é um recurso importante para resolver também o problema da ambigüidade:
“Aquela senhora encontrou o garotinho em seu quarto.”
Possíveis leituras:
1ª) A senhora estava no seu quarto e o garotinho entrou. Os dois se encontraram lá.
2ª) A senhora encontrou o garotinho no quarto dele.
Tipologia Verbal de Chafe
Do ponto de vista lógico-semântico, Chafe (apud Ignácio,2003), classifica os verbos em duas grandes visões: os verbos que expressam uma visão estática da realidade e verbos que expressam uma visão dinâmica: estes seriam os verbos de ação, processo e ação-processo e aqueles, os verbos de estado.
Borba(1996) apresenta os papéis sintático-semânticos dos verbos:
Considerando A1, na função de sujeito, se:
Ativo verbo ação
Afetado verbo processo
Ativo ou causativo c/(A2) verbo ação-processo
Inativo N at/ N af/ N ca verbo estado
Chafe
Chafe trabalhou com a tipologia verbal, trabalhou com a teoria da valências e propõe uma classificação para os verbos. Apresenta-os em quatro tipos: verbos de ação, verbos de processo, verbos de estado, verbos de ação-processo. Portanto, trabalha com a dicotomia: dinamicidade e estatividade. A vantagem desse estudo é principalmente pela leitura do texto. Pelo texto verifica-se o tipo de verbo que predomina. Textos científicos, verbos de estado; textos técnicos, verbos de estado; textos narrativos e dramáticos, misturam-se os verbos, mas, predominam os de ação.
2.2.1. Classificação da tipologia verbal de Chafe
A classificação apresentada é com base na teoria da predicação ou teoria argumental, centrada na Gramática de Valências e na Gramática de Casos, que analisa a relação do verbo com o sujeito.
a) Verbo de ação
- sempre tem o traço atividade, isto é, é um sujeito de fazer, ele faz alguma coisa. O verbo está relacionado com um sujeito agente. Ser animado, dotado de voluntariedade, tem controle sobre o ato. Isto também com relação aos seres humanos. O verbo de ação tem, no mínimo um argumento. Ele pode se realizar como especificador. Ex:
“O pássaro voa.”
“O homem pensa.”
b) Verbo de processo
- tem um aspecto de acontecimento ou evento (seres ou objetos) e relaciona-se com um sujeito que é afetado por algo que está fora dele. Ele é um paciente, um experimentador ou um beneficiário do processo. Tem obrigatoriamente um argumento. Dependendo da valência pode ter mais um argumento como complemento. Admite especificador. Ex:
“A chuva parou.”
“Marta ouve música.”
c)Verbo de ação-processo
- É um verbo que indica ao mesmo tempo uma ação e um processo, ou seja, um fazer por parte do Sujeito e um acontecer em relação ao Objeto. Tem no mínimo dois argumentos: um, agente/causativo e outro, afetado/efetuado, isto é, o A1(ag/Ca) faz com que A2 mude de estado, condição, posição, ou então passe a existir. Ex:
“José abriu a porta” // “José escreveu um romance.”
d )Verbos de estado
- Esse verbo indica um ser/ estar/ existirem relação ao sujeito.Estabelece uma relação entre uma entidade e um estado em que ela se encontre, também uma qualidade que lhe é atribuída.ou um sentimento de que é dotada. O argumento desse verbo é inativo, porque ele não é agente, nem paciente, nem causativo. O A1 desses verbos ou funciona como suporte de propriedades(estado/condição) ou como experimentador delas. Ex:
“Ana é bonita.”
“Eu estou com fome.”
Papéis temáticos – Gramática de Casos de Fillmore.
A gramática de casos se preocupa com as funções semânticas subjacentes na organização da frase, devendo determinar as relações sintático-semânticas ou temáticas (funções ou papéis temáticos) que fazem parte da estrutura conceitual dos itens léxicos. (Borba,1996:16-17)
Fillmore fala sobre papéis temáticos ou casos semânticos, que na análise de valências, também se leva em conta as relações sintático-semânticas ou temáticas dos argumentos do verbo. O verbo requer argumentos: sujeito, objetos diretos, objetos indiretos. É o que se chama Gramática de Casos. Nesses argumentos apresentam funções semânticas, para que a visão se torne mais clara, mais lógica. Portanto, a proposta de Fillmore é chamar a atenção para a descrição e análise do sistema lingüístico, no seu funcionamento. Apresenta-se quatro partes sistematizadas para o estudo:
Casos semânticos
São as relações dos argumentos do verbo.
Agente ou Agentivo (Ag): instigador da ação verbal
Características: ser animado, causador, volitivo(tem intenção de agir), controlador (tem controle sobre a ação).Ex:
“Eu escrevo todos os dias.” (Jornal A Cidade,24/09/2006.fls.3)
Paciente (Pac): recebe a ação verbal ou sofre os resultados de um processo.
Características: ser afetado pela ação ou processo.Ex:
“Cabral descobriu o Brasil”(SACCONI,1994.p.268)
Receptivo (Rec) ou Destinatário (Dest): a quem se destina a ação verbal. Ex: “Mataram dois pedestres.” (SACCONI,1994.p.260)
Beneficiário (Ben): é o que se beneficia ou é afetado pela ação ou pelo processo.Ex:
“Os casais vaiaram o ator.” (SACCONI,1994.p.261)
Experimentador (Exp): é o que experimenta um processo físico ou psíquico; o depositário de um sentimento ou experimentador de uma sensação. Caracteriza-se por ser animado.Ex:
“Ela gosta muito de mim.”(SACCONI, 1994.p.244)
Causativo (Ca): é o causador de uma ação ou de um processo. Apesar de potente para desencadear a ação, não tem controle sobre ela. Características: não-animado, apesar de potente, não tem controle sobre a ação e não é controlado. Ex:
“O vício fez-me miserável.”(SACCONI,1994.p.)
Instrumental (Instr): desencadeador de uma ação. Características: é controlado e pressupõe um agente que o manipula. Ex:
“O carro deslizou sobre o canteiro e atingiu a criança.” (SACCONI,1994.p.)
Objetivo (Ob):ponto de referência de um evento ou lugar de coisas. Características: neutralidade ( não é afetado).Ex:
“Esse cruzamento é perigoso”.(SACCONI,1004.p.255)
Origem (Or): é o ponto de origem de um processo. Ex:
“Alguém pode vir de lá de baixo? Explique.”(SACCONI,1994.p.220)
Locativo (Loc): lugar onde se realiza o evento ou lugar de referência de um estado de coisas. Ex:
“No Brasil, em se plantando, tudo dá.
nota:
Não se pode confundir funções sintáticas com funções semânticas:
Maria cortou o pão com uma faca afiada.
Analisando a oração pelas suas funções sintáticas, temos:
“Maria” (Agente = sujeito); “pão” (paciente = obj.direto); “faca afiada” (intrumental = adj.adv.instrumento)
Passando a oração para a voz passiva, alteram-se as funções sintáticas, mas não as semânticas:
O pão foi cortado por Maria com uma faca afiada.
Sintaticamente temos:
“O pão” (Paciente = sujeito); “Maria”(Agente =Agente da passiva); “faca afiada”(=Inst.)
Abreviaturas convencionadas de nomenclatura para os diversos elementos frasais.
1. Casos semânticos
Paciente (Pac), Objetivo (Ob), Experimentador (Exp), Causativo (Ca), Instrumental (Inst), Locativo (Loc), Receptivo (Rec), Destinatário (Dest), Beneficiário (Bem), Temporal (Temp), Modalizador (Mod).
2. Níveis Valenciais
- Actantes (Act), Argumentos (Arg).
3. Funções sintáticas
- Objeto Direto (OD), Objeto Indireto (OI), Complemento (Cp), Adjunto Adverbial (Adj Adv).
4. Estruturas sintágmáticas
- SN = Sintagma Nominal; SNpr = Sintagma Nominal Preposicionado; Sadv = Sintagma Adverbial; Det = Determinante; N = Nome; pr = preposição.
O conceito de valência
Segundo a gramática de valências, valência é a capacidade de determinados
lexemas10 estabelecerem relações com outros lexemas por força de seu significado
léxico. Em outras palavras, há lexemas que incluem em seu significado uma estrutura
de relação e o termo que está contido na estrutura de outro termo é o lugar vazio ou
argumento. Nesse sentido, a valência é entendida como uma rede de relações
abstratas em torno de um determinado lexema (Vilela e Kock, 2001, p.36).
Com base nessa definição de valência, pode-se dizer que os complementos do
verbo, por exemplo, “não são designados lexicalmente no próprio verbo, fora do seu
uso na frase: são apenas apresentados como lugares vazios a ser preenchidos
lexicalmente na frase.” Actantes são “as expressões que na frase correspondem aos
lugares vazios dos lexemas”. A valência, portanto, se estabelece em nível lexical
(Busse e Vilela, 1986, p.13-14).
Utilização da teoria de Tesnière e da Gramática de Valências na interpretação e construção do sentido do texto.
1. Justificativa
Há muito questionamento em torno das questões gramaticais da língua portuguesa, principalmente em se tratando da língua portuguesa brasileira, que está um tanto longe da língua materna portuguesa. Nesse trabalho abordou-se a questão da centralidade do verbo, apenas um segmento da gramática. Mesmo assim, o material pesquisado forneceu, com certeza, um embasamento que permitiu ao pesquisador defender sua proposta de usar a centralidade do verbo como elemento facilitador da interpretação e construção de sentido do texto. Espera-se que concluído este trabalho ele sirva não só para o pesquisador como também para todos aqueles interessados em minimizar a questão da rejeição que possuem nossas crianças e adolescentes pelos estudos da língua brasileira. Ao mesmo tempo apresentar a esses alunos uma forma prática, compreensível e até lúdica de se trabalhar com a construção dos sentidos. Pretende-se aplicar o resultado dessa pesquisa à língua portuguesa contextualizando temas diversos como geografia, ciências, matemática, e outras disciplinas, quebrando assim, o tabu de que as lições de português têm que serem ensinadas com textos que não se comprometem com as demais disciplinas.
Têm-se discutido inúmeras questões gramaticais, mas, até hoje, não houve a coragem de se apresentar uma proposta que enfrentasse os antigos conceitos, embora tão discutidos. A abordagem da língua portuguesa brasileira está de uma tal forma modificada que, em breve, se os antigos professores de português não se reciclarem em matéria de seus conteúdos acadêmicos, se não acompanharem as novas teorias, eles terão grandes problemas com eles mesmos, além do comprometimento, ensinando um assunto ultrapassado.
Também já era hora de enfrentar a questão da aversão que o brasileiro tem pelo estudo da língua materna, dos motivos que levam-no ao hábito de não ler, da falta de textos nas escolas, e tantos outros temas que não interessam ao trabalho em questão.
A proposta dos novos lingüistas nessa nova abordagem para os assuntos gramaticais, resgatam as teorias de
Lucien Tesnière, Chafe e Charles Fillmore, que em resumo serão apresentadas neste estudo.
Pode-se definir gramática funcional como uma teoria que considera a competência comunicativa em suas análises da organização gramatical das línguas. Em outras palavras, a gramática funcional prioriza a capacidade que os falantes têm de codificar e decodificar expressões, de usar e interpretar essas expressões de forma interacional (Neves, 2001, p.15).
Têm-se discutido inúmeras questões gramaticais, mas, até hoje, não houve a coragem de se apresentar uma proposta que enfrentasse os antigos conceitos, embora tão discutidos. A abordagem da língua portuguesa brasileira está de uma tal forma modificada que, em breve, se os antigos professores de português não se reciclarem em matéria de seus conteúdos acadêmicos, se não acompanharem as novas teorias, eles terão grandes problemas com eles mesmos, além do comprometimento, ensinando um assunto ultrapassado.
Também já era hora de enfrentar a questão da aversão que o brasileiro tem pelo estudo da língua materna, dos motivos que levam-no ao hábito de não ler, da falta de textos nas escolas, e tantos outros temas que não interessam ao trabalho em questão.
A proposta dos novos lingüistas nessa nova abordagem para os assuntos gramaticais, resgatam as teorias de
Pode-se definir gramática funcional como uma teoria que considera a competência comunicativa em suas análises da organização gramatical das línguas. Em outras palavras, a gramática funcional prioriza a capacidade que os falantes têm de codificar e decodificar expressões, de usar e interpretar essas expressões de forma interacional (Neves, 2001, p.15).
2. Objetivo
Objetiva-se com este trabalho descobrir um caminho mais lógico para o exercício da construção dos sentidos e interpretação dos textos para alunos do ensino fundamental, de forma que ao mesmo tempo ele esteja familiarizado com os conceitos sintáticos e semânticos, os quais não se pretende separar.
Tendo como objetivo descrever como o falante distribui as informações na frase para obter a atenção do seu ouvinte na interação verbal, ou seja, o desempenho lingüístico do falante, a gramática funcional pretende chegar à estrutura da frase. O falante pode fazer alterações na ordem dessas informações para contribuir para a comunicação com o intuito de controlar a atenção do ouvinte. Em outras palavras, esse fluxo de informações está relacionado com a organização linear dos sintagmas nominais na frase. Estou falando do que na gramática funcional denomina-se ‘tópico e comentário’, ‘sujeito e predicado’, ‘informação dada e informação nova’, ‘tema’ e ‘rema’, etc. (Neves, 2001, p.32-34).
A função ideacional é um componente do significado no sistema lingüístico. Em outras palavras, a linguagem serve à expressão do onteúdo, isto é, tem uma função ideacional, ou seja, significado cognitivo. É por meio dessa função que o falante e o ouvinte organizam e incorporam, ou seja, codificam na língua, sua 7 Uma rede sistêmica constitui um conjunto finito de traços.
[…] ‘função’ pode ser pensada como um sinônimo para a palavra ‘uso’, logo, quando falamos sobre funções da linguagem, podemos apenas significar a forma como as pessoas usam sua língua ou suas línguas se tiverem mais de uma. experiência dos fenômenos do mundo, o que inclui o mundo interno da própria consciência, suas reações, cognições, percepções, assim como seus atos lingüísticos
de falar e entender. A função ideacional é a função dos significados. Essa função liga- se ao sistema de transitividade e está associada na frase aos papéis de ator, meta, etc.
Trata-se da frase como processo (Neves, 2001, p.60-61).
3. Metodologia
Pretende-se para realização do trabalho a desenvolver, bem como a razão da divisão do texto em capítulos, seções e subseções, a seguir apresentar-se-á comentários sobre a metodologia utilizada, que segue rigorosamente os padrões estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).
A metodologia usada para a realização da pesquisa partiu da escolha do tema, baseado num enfoque considerado pelo pesquisador como necessário para nossos dias. Escolhido o tema, depois o orientador na área, passou-se a procurar as obras para leitura, numa ordem sugerida pelo professor-orientador. Essas obras, conforme descrição na bibliografia, fornecerão embasamento teórico necessário para argumento e comprovação do tema. Também está-se em busca de verificação se nossas gramáticas abordam tais assuntos e, à medida da evolução da pesquisa, pretende-se aplicar resultados para observar o sucesso do tema aplicado.
Bibliografia
SACCONI, L. A.Gramática Essencial Ilustrada – GEI. São Paulo: Atual, 1994.
IGNÁCIO,S.E.Análise sintática em três dimensões:uma proposta pedagógica.Franca,São Paulo:Ribeirão Gráfica e Editora,2003.
CARONE,F.B.Morfossintaxe.3.ed.,São Paulo:Ática,1986.[série Princípios]
BORBA,F.S.et alii.Dicionário gramatical de verbos do português contemporâneo do Brasil.São Paulo:Editora UNESP,1990.
CHAFE, Estrutura e significados para verbos.
TESNIÉRE. Sintaxe Estrutural
BORBA, . Gramática de Valências.
VILLELA, ..........
MARIA HELENA e ILARI...........
ILARI, Rodolfo. Introdução à Semântica – brincando com a gramática. 5 ed. São Paulo: Contexto, 2004.
(embasamento teórico )
(obras consultadas)
A teoria de Tesnière se fundamenta na centralidade do verbo. Além de Tesnière, segue-no Fillmore(1971), Chafe(1979), Ignácio(1984), entre outros. De acordo com a proposta da centralidade do verbo, é ele, e não o sujeito o centro estruturador da oração. Nessa visão, a oração se estrutura a partir da valência verbal, isto é, existem elementos que se relacionam com o verbo, estabelecendo com ele relações sintático-semânticas para compor a oração. Para Tesnière, a palavra que se prende à outra, forma com ela um ‘nó’, e como todas palavras se prendem ao verbo, ele diz, que o verbo é o nó central.
Fillmore, também é seguidor da centralidade do verbo, porém, estudou as relações entre os constituintes de uma sentença. Tratando da semântica lexical, ele desenvolveu um modelo alternativo de gramática, estabelecendo que a sentença era constituída de um verbo e de um ou mais SNs, onde cada um estabelecia uma relação particular com o verbo.
Para Fillmore, se houver dois SNs na sentença, o de maior hierarquia, este será o sujeito. Estabeleceu então, um grupo de palavras, que dependendo do sentido, essas palavras podem tomar diferentes posições na frase , sempre ligadas ao verbo e entre si. Esse estudo chama-se Gramática de Casos, de Fillmore, que trata dos papéis semânticos ou temáticos, ou sejam: agentes, pacientes, receptivos e outros, que trataremos mais adiante.
Concordando também com centralidade do verbo é a Tipologia Verbal de Chafe, que vai analisar a visão dos verbos, sobre o ponto de vista lógico-semântico: verbos de estado, de ação, de processo, de ação-processo, que também veremos adiante com maiores detalhes.
Lucien Tesnière
A partir de Tesnière (1953/1959), a divisão a oração em Sujeito e Predicado tem sido contestada. Com ele surge o princípio da centralidade do verbo na organização da oração e, a oração é comparada a um pequeno drama, onde o enredo é o verbo. Envolvidos nesse drama estão três personagens e a ação desenrola-se entre as mais variadas circunstâncias, assim como ocorre na vida real. Por isso ele chama de atores esses três personagens, são gramaticalmente chamados de actantes. Ao lado desses actantes, surgem os circunstantes, para a gramática tradicional, os adjuntos adverbiais. Esses actantes se articulam com o verbo e vai determinar a valência desse verbo.
Assim, o verbo passa a ser o elemento a partir do qual a oração se organiza e o sujeito, passa a ter a configuração de um complemento no mesmo nível sintático do Objeto, considerando, obviamente a sua distinção pelo seu papel semântico.
Como vimos, na teoria dos “nós”, elementos da oração se prendem ao verbo, formando com ele numa relação de dependência. Valência é o nome dado a esse tipo de dependência de outras palavras da oração com o verbo. Foi Tesnière que difundiu de maneira mais bem sistematizada, o conceito de valência verbal. Portanto, o verbo é classificado pela sua valência, isto é, pelo número de elementos que vão preencher as “casas vazias” da estrutura oracional, às quais o verbo está comandando. Esses lugares vazios, ou casas vazias, são preenchidas por elementos, que Tesnière os chamou de actantes.
Uma gramática de valência procura detectar relações de dependência entre categorias (básicas) que (co) ocorrem num contexto. (...)uma gramática de valências toma como nuclear um elemento oracional (o verbo) e demonstra como os demais se dispõem em torno dele através de relações de dependência. (Borba,1996:16-17).
A Gramática de Valências estuda os valores semânticos, a natureza morfossintática e o número dos elementos nominais obrigatórios ( Argumentos) exigidos pelo verbo ou pelo nome.
De acordo com sua valência, os verbos recebem nomes especiais:
avalentes – quando não tiver necessidade de nenhum actante. Acontecem com os verbos impessoais:
- São dez horas(sem consulta)
monovalentes – quando tiver necessidade de apenas um actante. Acontecem com os verbos de ação, como andar, voar, correr, e de processo como adoecer, crescer, engordar, etc:
Bivalentes – quando tiver necessidade de dois actantes:
Trivalentes – quando tiver necessidade dos três actantes:
Esses actantes são representados por palavras substantivadas e os circunstantes, adverbiais.
Translação e Estema
Tesnière apresenta duas maneiras para explicar a sintaxe da oração: a translação e o estema.
A translação tenta explicar a conexão entre as palavras, Tesnière criou um critério de verificação onde evidencia as possibilidades de relações entre as classes, pela vizinhança vertical e horizontal. Ele criou um quadro dividido em quatro partes, representando cada parte, uma classe gramatical. Situou na parte superior substantivo e verbo e nas inferiores, adjetivo e advérbio. Adotou uma letra do alfabeto para simbolizar cada categoria: o substantivo, O; o verbo, I; o adjetivo, A e o advérbio, E. Cada uma dessas palavras podem assumir o comportamento das outras três. Essa mudança de comportamento se faz através do recurso de uma preposição, dizemos então que há um SP.
Para Tesnière, a translação é a mudança de comportamento gramatical de uma palavra. A translação é necessária porque muitas vezes em português não conseguimos expressar a idéia de um adjetivo com uma única palavra. Daí a necessidade de usarmos um SP. Nesse caso, muitas vezes há a mudança da classe gramatical da palavra – isso corresponde a translação. No entanto, nem toda preposição acarreta um caso de translação.
Por exemplo: panela de arroz. A expressão não se refere a uma panela que contenha arroz, e sim, uma panela de se cozinhar o arroz. Necessitou-se de uma preposição para exprimir o desejo de se referir aquele objeto. Neste caso, através da preposição efetuou-se uma translação, ou seja, uma termo que era substantivo arroz, passou a ser adjetivo, porque deu uma qualidade para a panela.
Para esquematizar o processo, então chamado de translação, Tesnière desenhou um esquema gráfico da seguinte maneira:
Esquematizando, podemos fazer a representação pela letra “T” maiúscula, inicial da palavra translação. À esquerda coloca-se o instrumento de translação, geralmente, uma preposição, chamada de translativo. À direita do T, coloca-se o elemento que sofre a translação, no caso, o transferendo e, acima da barra do “T”, coloca-se o transferido, assinalado pelo seu símbolo, ou seja, o resultado da translação.
Pode ocorrer que não haja o translativo e que a translação ocorra simplesmente entre dois substantivos, um deles, com caráter adjetivo: Exemplo: O viaduto Sarney. Nesse caso, um substantivo comporta-se como epíteto do outro ( adjunto adnominal).
Também é preciso considerar que o verbo “ser” por si só provoca uma translação. Todo verbo ser caracteriza um predicado nominal, por isso chamado predicativo. Se o núcleo é um predicativo, obviamente, o predicado toma a característica verbal.
b) Estema
É a outra possibilidade de mostrar a sintaxe por Tesnière. Nesse sentido, para recuperar a ordem da frase, tem-se que localizar primeiro os verbos, depois os actantes, depois os circunstantes. Localizado o verbo, procura-se a sua valência.
Estema (Tesnière trabalha com “nós”)
Portanto, estema é o nome que Tesnière dá à a representação gráfica das relações sintáticas das palavras na oração: No alto o verbo, no segundo nível e à esquerda, os valores substantivos e à direita, os valores adverbiais, os circunstantes. Conexões sintáticas são representadas por linhas retas perpendiculares. Segue abaixo dois exemplos de estemas completos. 1º ex: “A CSN zerou com o BNDES suas dívidas, em agosto.”
(VEJA,2005.p.35)
O estema, por ter uma conotação semântica, é um recurso importante para resolver também o problema da ambigüidade:
“Aquela senhora encontrou o garotinho em seu quarto.”
Possíveis leituras:
1ª) A senhora estava no seu quarto e o garotinho entrou. Os dois se encontraram lá.
2ª) A senhora encontrou o garotinho no quarto dele.
Tipologia Verbal de Chafe
Do ponto de vista lógico-semântico, Chafe (apud Ignácio,2003), classifica os verbos em duas grandes visões: os verbos que expressam uma visão estática da realidade e verbos que expressam uma visão dinâmica: estes seriam os verbos de ação, processo e ação-processo e aqueles, os verbos de estado.
Borba(1996) apresenta os papéis sintático-semânticos dos verbos:
Considerando A1, na função de sujeito, se:
Ativo verbo ação
Afetado verbo processo
Ativo ou causativo c/(A2) verbo ação-processo
Inativo N at/ N af/ N ca verbo estado
Chafe
Chafe trabalhou com a tipologia verbal, trabalhou com a teoria da valências e propõe uma classificação para os verbos. Apresenta-os em quatro tipos: verbos de ação, verbos de processo, verbos de estado, verbos de ação-processo. Portanto, trabalha com a dicotomia: dinamicidade e estatividade. A vantagem desse estudo é principalmente pela leitura do texto. Pelo texto verifica-se o tipo de verbo que predomina. Textos científicos, verbos de estado; textos técnicos, verbos de estado; textos narrativos e dramáticos, misturam-se os verbos, mas, predominam os de ação.
2.2.1. Classificação da tipologia verbal de Chafe
A classificação apresentada é com base na teoria da predicação ou teoria argumental, centrada na Gramática de Valências e na Gramática de Casos, que analisa a relação do verbo com o sujeito.
a) Verbo de ação
- sempre tem o traço atividade, isto é, é um sujeito de fazer, ele faz alguma coisa. O verbo está relacionado com um sujeito agente. Ser animado, dotado de voluntariedade, tem controle sobre o ato. Isto também com relação aos seres humanos. O verbo de ação tem, no mínimo um argumento. Ele pode se realizar como especificador. Ex:
“O pássaro voa.”
“O homem pensa.”
b) Verbo de processo
- tem um aspecto de acontecimento ou evento (seres ou objetos) e relaciona-se com um sujeito que é afetado por algo que está fora dele. Ele é um paciente, um experimentador ou um beneficiário do processo. Tem obrigatoriamente um argumento. Dependendo da valência pode ter mais um argumento como complemento. Admite especificador. Ex:
“A chuva parou.”
“Marta ouve música.”
c)Verbo de ação-processo
- É um verbo que indica ao mesmo tempo uma ação e um processo, ou seja, um fazer por parte do Sujeito e um acontecer em relação ao Objeto. Tem no mínimo dois argumentos: um, agente/causativo e outro, afetado/efetuado, isto é, o A1(ag/Ca) faz com que A2 mude de estado, condição, posição, ou então passe a existir. Ex:
“José abriu a porta” // “José escreveu um romance.”
d )Verbos de estado
- Esse verbo indica um ser/ estar/ existirem relação ao sujeito.Estabelece uma relação entre uma entidade e um estado em que ela se encontre, também uma qualidade que lhe é atribuída.ou um sentimento de que é dotada. O argumento desse verbo é inativo, porque ele não é agente, nem paciente, nem causativo. O A1 desses verbos ou funciona como suporte de propriedades(estado/condição) ou como experimentador delas. Ex:
“Ana é bonita.”
“Eu estou com fome.”
Papéis temáticos – Gramática de Casos de Fillmore.
A gramática de casos se preocupa com as funções semânticas subjacentes na organização da frase, devendo determinar as relações sintático-semânticas ou temáticas (funções ou papéis temáticos) que fazem parte da estrutura conceitual dos itens léxicos. (Borba,1996:16-17)
Fillmore fala sobre papéis temáticos ou casos semânticos, que na análise de valências, também se leva em conta as relações sintático-semânticas ou temáticas dos argumentos do verbo. O verbo requer argumentos: sujeito, objetos diretos, objetos indiretos. É o que se chama Gramática de Casos. Nesses argumentos apresentam funções semânticas, para que a visão se torne mais clara, mais lógica. Portanto, a proposta de Fillmore é chamar a atenção para a descrição e análise do sistema lingüístico, no seu funcionamento. Apresenta-se quatro partes sistematizadas para o estudo:
Casos semânticos
São as relações dos argumentos do verbo.
Agente ou Agentivo (Ag): instigador da ação verbal
Características: ser animado, causador, volitivo(tem intenção de agir), controlador (tem controle sobre a ação).Ex:
“Eu escrevo todos os dias.” (Jornal A Cidade,24/09/2006.fls.3)
Paciente (Pac): recebe a ação verbal ou sofre os resultados de um processo.
Características: ser afetado pela ação ou processo.Ex:
“Cabral descobriu o Brasil”(SACCONI,1994.p.268)
Receptivo (Rec) ou Destinatário (Dest): a quem se destina a ação verbal. Ex: “Mataram dois pedestres.” (SACCONI,1994.p.260)
Beneficiário (Ben): é o que se beneficia ou é afetado pela ação ou pelo processo.Ex:
“Os casais vaiaram o ator.” (SACCONI,1994.p.261)
Experimentador (Exp): é o que experimenta um processo físico ou psíquico; o depositário de um sentimento ou experimentador de uma sensação. Caracteriza-se por ser animado.Ex:
“Ela gosta muito de mim.”(SACCONI, 1994.p.244)
Causativo (Ca): é o causador de uma ação ou de um processo. Apesar de potente para desencadear a ação, não tem controle sobre ela. Características: não-animado, apesar de potente, não tem controle sobre a ação e não é controlado. Ex:
“O vício fez-me miserável.”(SACCONI,1994.p.)
Instrumental (Instr): desencadeador de uma ação. Características: é controlado e pressupõe um agente que o manipula. Ex:
“O carro deslizou sobre o canteiro e atingiu a criança.” (SACCONI,1994.p.)
Objetivo (Ob):ponto de referência de um evento ou lugar de coisas. Características: neutralidade ( não é afetado).Ex:
“Esse cruzamento é perigoso”.(SACCONI,1004.p.255)
Origem (Or): é o ponto de origem de um processo. Ex:
“Alguém pode vir de lá de baixo? Explique.”(SACCONI,1994.p.220)
Locativo (Loc): lugar onde se realiza o evento ou lugar de referência de um estado de coisas. Ex:
“No Brasil, em se plantando, tudo dá.
nota:
Não se pode confundir funções sintáticas com funções semânticas:
Maria cortou o pão com uma faca afiada.
Analisando a oração pelas suas funções sintáticas, temos:
“Maria” (Agente = sujeito); “pão” (paciente = obj.direto); “faca afiada” (intrumental = adj.adv.instrumento)
Passando a oração para a voz passiva, alteram-se as funções sintáticas, mas não as semânticas:
O pão foi cortado por Maria com uma faca afiada.
Sintaticamente temos:
“O pão” (Paciente = sujeito); “Maria”(Agente =Agente da passiva); “faca afiada”(=Inst.)
Abreviaturas convencionadas de nomenclatura para os diversos elementos frasais.
1. Casos semânticos
Paciente (Pac), Objetivo (Ob), Experimentador (Exp), Causativo (Ca), Instrumental (Inst), Locativo (Loc), Receptivo (Rec), Destinatário (Dest), Beneficiário (Bem), Temporal (Temp), Modalizador (Mod).
2. Níveis Valenciais
- Actantes (Act), Argumentos (Arg).
3. Funções sintáticas
- Objeto Direto (OD), Objeto Indireto (OI), Complemento (Cp), Adjunto Adverbial (Adj Adv).
4. Estruturas sintágmáticas
- SN = Sintagma Nominal; SNpr = Sintagma Nominal Preposicionado; Sadv = Sintagma Adverbial; Det = Determinante; N = Nome; pr = preposição.
O conceito de valência
Segundo a gramática de valências, valência é a capacidade de determinados
lexemas10 estabelecerem relações com outros lexemas por força de seu significado
léxico. Em outras palavras, há lexemas que incluem em seu significado uma estrutura
de relação e o termo que está contido na estrutura de outro termo é o lugar vazio ou
argumento. Nesse sentido, a valência é entendida como uma rede de relações
abstratas em torno de um determinado lexema (Vilela e Kock, 2001, p.36).
Com base nessa definição de valência, pode-se dizer que os complementos do
verbo, por exemplo, “não são designados lexicalmente no próprio verbo, fora do seu
uso na frase: são apenas apresentados como lugares vazios a ser preenchidos
lexicalmente na frase.” Actantes são “as expressões que na frase correspondem aos
lugares vazios dos lexemas”. A valência, portanto, se estabelece em nível lexical
(Busse e Vilela, 1986, p.13-14).